Bolsonaro precisa ser escorraçado do poder. A primeira vez que votei para presidente foi em 2006. Heloísa Helena no primeiro turno e Geraldo Alckmin no segundo. Lula ganhou, fez um excelente segundo governo e deixou o Brasil muito bem.
Em 2010 votei com entusiasmo na Dilma. Até transferi meu título para votar nela. Tinha tudo o que eu admirava: ranzinza, tecnocrática, o carisma de uma porta, workaholic e metódica. Erro de cálculo. Por alguma razão achei que estava na Suécia, onde a Dilma passaria por uma razoável representante social democrata. Esses atributos se adequariam aos dos líderes de países que não precisam de uma mãe ou um salvador para administrar a quitanda. Dilma não era nenhum desses dois.
Em 2014 justifiquei porque perdi o prazo de transferir o título de volta para onde eu estava. 2018 foi a vez de votar em Ciro e Haddad. Encarei duas vezes filas gigantes na frente do consulado brasileiro em Londres. Filas tomadas por pessoas vestidas de verde e amarelo que aproveitavam o conforto do estado de bem-estar social inglês para votar no Bolsonaro.
Nobreza é abrir mão de uma prerrogativa legítima e incontestável em nome de um bem maior. Um nível hard de generosidade. Lula não tem essa nobreza. Sair do caminho, abrir espaço para que uma liderança no PT possa emergir de forma espontânea e oxigenar o ambiente político é uma ofensa a sua prerrogativa legítima de se candidatar.
Votaria sem problemas em outro nome do PT ou outra figura democrata que tivesse corpo para rivalizar com a polarização Lula-Bolsonaro. A tal da terceira via, que também é legítima. Essa figura não surgiu e tudo indica que não vai surgir.
Para ficar nos quatro primeiros colocados até o momento, Moro é uma aventura perigosa como foi Jânio Quadros na década de 60, Collor na década de 90. Não dá pra arrumar um simulacro de político desses a cada 30 anos. Não votaria nele nem se fosse ao segundo turno com Bolsonaro. Anularia, que aliás é um recurso democrático que recomendo muito a quem tem nojinho do Lula e não quer sujar as mãos de sangue (talvez pela segunda vez) com o capitão.
Ciro Gomes empacou. Pode surpreender com muito esforço do João Santana (que o Ciro, convenhamos, é capaz de demolir com o jeitinho dele), mas o teto deve ser os 12% que teve em 2018 com o auxílio luxuoso de gente que votava no PT, desesperada com a possibilidade do Bolsonaro se eleger.
Não dá para brigar com números. Além de legítima, Lula é uma força que reúne sólidos 44% dos votos no primeiro turno. Mesmo com muita água para rolar até outubro, estes números não devem despencar. Político pragmático como sempre foi, Lula fala em fazer mutirão para governar. Mutirão para governar é o mais próximo que vamos ter da bendita frente ampla. Ele está certo.
Com uma estrutura política pulverizada em mil partidos, dizer que vai governar sem o Centrão é uma hipocrisia besta que funcionou em 2018 e deu no que deu. Temos um porco destruindo tudo o que pode e espalhando a farofa no chão. Não haverá um lindo movimento progressista tomando conta do Congresso. Dos ventos de 2002 só sobrou o Lula. Quem assumir, vai ter que governar com o Centrão.
Se a realidade é essa, que tragam os profissionais para a mesa. Estou de dedos cruzados para a chapa Lula-Alckmin se concretizar. A imprensa especula que Lula gostaria do Alckmin no PSD. Está certo. Isso é mutirão para governar. Aliança com o PSD expande governabilidade, com o PSB cria uma bonita chapa para a fotografia. Independente da chapa com o PT, o PSB vai chegar junto. Lula quer aliança com o PSD já no primeiro turno. Ou vamos achar que o Kassab não vai ter participação no governo? Talvez saia dessas eleições como uma força superior ao MDB. Lula deve estar sentindo esse cheiro no ar.
Em 2006 votei no Alckmin para não votar no Lula. Em 2022, votaria no Lula pela esperteza de se aliar a alguém como Alckmin. É o cenário com maior potencial de implodir Bolsonaro em mil pedacinhos. Vencer no primeiro turno seria uma resposta contundente e inquestionável aos selvagens que produziram miséria, inflação, devastação florestal e mais de 600 mil mortes no país. Não merecemos um segundo turno com o caos que Bolsonaro é capaz de promover. É frustrante que a opção de futuro seja voltar 20 anos. Mas quando Bolsonaro é a referência, voltar para 2002 é avançar 400 anos.
Votarei com minha camisa do MST que ainda nem tenho
Melhor frase: quando Bolsonaro é referência, voltar 20 anos é avançar 400. Muito boa sua análise. Clara, pragmática, sensata. Tô nessa vibe também.